Esta matéria foi escrita por João Rural na Revista Nascentes nº 1 Outubro de 2000, parte II
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A tradição de comer içá mais do que nunca, está viva em nossa região. Perdem-se no tempo quando começou. A iguaria sempre foi apreciada pelos brasileiros, desde mais simples até personalidades, como Monteiro Lobato. Mais recente, o padeiro Anquir, aquele que fez sucesso na copa da frança e casou com Deborah Bloch, descobriu a içá na região do vale histórico. Levou para seu programa de receitas na TV e tornou-se um dos apreciadores afirmando que iça é uma das iguarias exóticas do Brasil que deve ser divulgada. Em Paraibuna sabemos de muita gente que gosta. Alguns procuram esconder isso, mas outros fazem questão de contar. Claudio Reis, João Guará são alguns exemplos. O costume de se comer iça vem de séculos. Como começou se perde no tempo. Pesquisadores dizem que jesuítas é que forçaram o costume, fazendo o povo comer acreditando que assim dizimavam as formigas saúvas. Outros afirmam que o costume vem dos índios mesmo, quando era chamado de “comida dos bugres”. Dúvidas a parte, interessante é que nos últimos anos o costume tem ganhado o interesse da imprensa, com reportagens e divulgação de receitas com içá. Segundo os antigos a içá que é a rainha do formigueiro, aparece sempre no mês de outubro até o começo de novembro dependendo do tempo. Depois de uma chuva com trovões as iças são empurradas do formigueiro, para fazerem seus vôos nupciais. Antes saem os “sabitús”, que são os machos. No vôo chamado de nupcial, fazem o cruzamento em pleno ar. Em alguns locais são tantos que conseguem fazer uma nuvem em frente ao sol. Depois do cruzamento, descem cortam suas próprias asas e faz um buraco na terra para iniciar seu formigueiro. Mas poucas tem sucesso. Tem até mesmo içás que saem de manhã e as que saem à tarde, sempre depois de um mormaço. Os moradores da roça dizem até mesmo que tem um “sol de içá”, indicando que elas vão fazer vôo naquele dia.
Monteiro
Monteiro Lobato, em 1945 quando morava ainda e São Paulo solicitou e recebeu uma latinha de içá de sua prima Beijoca. Para agradecer enviou a seguinte carta:
“Beijoca recebi a latinha de içá torrado. Creio que ainda gosto disso apenas como meio de me recordar do Taubaté do meu tempo, uma coisa que já nada tem que ver com Taubaté de hoje. Mas foi você incomodar dona Silvina… Para mim foi muito bom, porque me rendeu o bilhetinho que ela lhe mandou, com o pedido em troca de içá, de um pensamento sobre içá… a sugestão me perturbou, porque nunca no mundo ninguém jamais “pensou” sobre içá e pelo jeito é realmente a coisa “impensamentável”, mas já que a dona Silvina pede, faço um esforço e digo que o “IÇÁ É O CAVIAR DA GENTE TAUBATEANA”. Como você sabe, o famosíssimo e apreciadíssimo caviar da Rússia é a ova dum peixe de nome esturjão: e que é o abdômen (vulgo bundinha) do içá senão a ova da formiga saúva? Adeus, Beijoca. Saudades a todos dai e meus cumprimentos a dona Silvina. Zé bento ( José Bento Monteiro Lobato)”.